quarta-feira, 20 de janeiro de 2010
- Bem, isso é um sonho de ficar de barriga cheia. E não sonhaste com pipocas coloridas salpicadas na cama?
- Não, mas sabes o que é que eu acho? Como há máquinas de fazer pipocas, havia de haver máquinas de fazer tempo. Saía tempo aos bocadinhos de dentro de uma panela.
- Vinte minutinhos agora, meia horita depois...
- Sim! Assim o meu tic tic deixava de estar cá dentro a fazer toc toc estou aqui! sou a saudade! E a memória não recomeçava - o guarda saudades da cabeça.
- Porque é que o leite encolhe no microondas?
- Aha?
- Porque é que quando aqueço o leite no microondas ele encolhe?
- Porque é que estamos sempre a falar de comida?
- São necessidades homeostáticas. Por exemplo, quando não estás como gelatina de morango. É como se te desse beijinhos depois de comeres gomas.
- Ah, está bem.
terça-feira, 5 de janeiro de 2010
Cereja mal comida
Era meia-noite e meia e ela ainda comia cerejas.
Lá do alto, viu uma coisificação de mangas de capote que a deixou perturbada: um homem feito de massa com cabeça de carne picada e olhos de cereja mal comida encarrapitados na sua fronte. Tudo bem que já tinha visto homens batata frita - homens batata frita douradinha e estaladiça – mas nessa altura vivia uma dissonância cognitiva que elevava o seu status quo: seriam os psicólogos gente séria? Os psicólogos são uns mentirosos. Sim, sim, eles mentem às pessoas, dizem que vão fazer experiências com elas e depois, pimbas, fazem outras. Não, não, não é esse pimbas. Esse pimbas tem sabor e sabedoria. Eu saibo a caramelo, tu sabes a café. Eu sei a caramelo, tu sabes a café. (Tu sabes e eu sabia?)
Eis então que, deitadinho no seu divã freudiano (e não froidiano), a antropomorfização de macarrão grita cá para cima: E se eu te disse que um elefante e um rato são uma única e mesma pessoa? Da mesma maneira que um pintainho acaba sendo, afinal de contas, uma goma gigante de peluche?
Eram sete e meia da manhã e ela já não comia cerejas.